Filhos para que vos quero?
O que nos faz humanos é a maneira própria que temos de sentir, somos tão sedentos de emoções que pagamos para ser assustados num filme de terror, ou saltamos de alturas vertiginosas para sentir medo. Também lemos dramas e mistérios, admiramos quadros e fotografias, espreitamos as personagens numa peça de teatro para saber o que estão a sentir, para descobrir novos sentimentos e novos sentires. Desenvolvemos a Arte para nossa felicidade, encontrámos maneiras de ser, sentir e comunicar sentimentos e emoções: é isto que é viver.
Para que sobrevivamos precisamos de dinheiro, claro. É com trabalho que o vamos conseguir, temos de cumprir as tarefas que nos são destinadas, com mais ou menos entusiasmo, porque precisamos de comer várias vezes ao dia, ter uma casa, roupa, saúde, higiene, conforto, mas a vida ou melhor A VIDA, não se reduz a isso. Reduzir a nossa existência enquanto espécie a escravos do capital, da rotina e das contas a pagar é negar a nossa humanidade.
Compete-nos, enquanto pais, educar os nossos filhos. Compete-nos a todos educar as nossas crianças, porque são herdeiros do que somos enquanto espécie, enquanto sociedade, enquanto civilização, enquanto Humanidade! A educação é o mais importante gesto social, é o garante da preservação da sociedade, do futuro, da nossa sobrevivência. É, portanto, um papel de todos e que todos assumimos mais ou menos conscientes de que o estamos a fazer! A educação acontece com naturalidade e segundo diversos processos: formação, ensino, instrução, modelagem, descoberta, moralização, confronto... Lembro-me de ter aprendido em casa a pedir por favor e a agradecer, mas lembro-me que quando comecei a ir às compras me esquecia disso. Mas tanto o padeiro como a senhora da fruta ou o senhor Antero da mercearia se encarregavam de me lembrar de dar os bons dias ao chegar, pedir por favor o que queria e, depois de servido e tendo pago, agradecer e despedir-me. Regras básicas de viver em sociedade, regras da boa educação, regras de respeito pelo outro e pelas coisas que são de todos não são especificas de uma profissão, são competência de toda a gente de forma natural e instintiva.
O professor tem competências acrescidas para educar? Alguns, mas não é a competência para educar que lhe é exigida, mas sim a competência para ensinar. Ensinar um corpo de conhecimentos que a sociedade reconhece, valoriza e avalia em função do perfil traçado para os cidadãos que se espera vir a ter amanhã, Neste processo o papel do professor está bem definido; o professor deve ser o facilitador das aprendizagens. Cumpre assim a escola o seu papel de formação científica e técnologica, e e de espaço privilegiado de crescimento na relação como outro, na descoberta do papel social e na formação de cidadãos informados, críticos, responsáveis e interventivos.
Surgiu esta semana da parte do presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), Jorge Ascensão a sugestão que os alunos passem a ter apenas um mês de férias no Verão, ou seja um ano lectivo de onze meses. Acredito que a ideia era ajustar a actividade escolar às condições laborais dos pais que, sem grandes alternativas onde deixar os filhos nas interrupções lectivas, vêem na escola um lugar seguro e barato onde deixar os seus filhos. Assim, resolve-se o um problema que as famílias têm para agudizar o problema que as famílias têm: falta de tempo para ser família,
Os pais e encarregados de educação depositam grande confiança no trabalho realizado por professores e outros agentes da acção educativa, isso é referido em estudos e deve encher de orgulho a classe docente. Então e a família? Já os pais não têm tempo para ser pais e agora as crianças não podem ter tempo para ser crianças? Porque os pais trabalham 11 meses querem que os filhos também estejam na escola o mesmo tempo? Não estaremos a ver a história ao contrário? Por que não se exige mais tempo para ser família?
Sugerir que quem tem filhos em idade escolar tivesse mais tempo atribuído pelo estado para poder estar com os filhos nas interrupções lectivas e ao fim do dia só trazia vantagens:
Melhor relação entre os pais e os filhos, mais tempo de férias para os progenitores e encarregados de educação e um estimulo sério a construir família. É que ter filhos para os depositar numa escola 11 meses por ano é qualquer coisa que não me cabe na cabeça! A este senhor presidente gostava de deixar a seguinte reflexão: Entre pais e filhos a maior demonstração de amor é o tempo que lhes dedicam. Uma sociedade regida apenas pelos horários de trabalho e obcecada nisso perde toda a sua humanidade.
Podem dizer-me que estou a ser lírico e que um modelo social mais centrado na família nos arrastaria para o caos económico. Que o futuro está em imitar a economia chinesa, criar amorfos, obedientes e acríticos funcionários, que assim sermos a China da Europa e teremos uma competitividade internacional pelo baixo custo do trabalho por hora.
Há certamente quem aceite isto como natural e inevitável, mas eu não me conformo.
Brilhante!!
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